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1ª Sessão | December 2, 2019  | 324 Lotes

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SIMÃO RODRIGUES - C. 1560-1629 O Beijo de Judas óleo sobre madeira restauros Dimensões (altura x comprimento x largura) - 137 x 117 cm Notas: SIMÃO RODRIGUES
(Alcácer do Sal, c. 1560 - Lisboa, 1629)
Esta muito interessante peça maneirista portuguesa de cerca de 1600, proveniente de um antigo e desmembrado retábulo de ignota origem, constitui um valioso testemunho da fase de grande produção seriada a que se convencionou chamar Contra-Maniera (o Maneirismo da Contra-Reforma) e da arte daquele que, na passagem do século XVI para o XVII, foi o seu mais ilustre representante. Representa a Prisão de Jesus no passo do Beijo de Judas, incluindo o dinâmico sub-tema do corte da orelha de Malco por São Pedro, que ocupa o primeiro plano da composição.
Simão Rodrigues, o seu autor, já em 1589 era considerado «hum dos milhores pimtores de imaginaria de olio que há nestes Reynos», trabalhando também a fresco, e como iluminador, tendo sido elogiado pelo exigente tratadista Félix da Costa Meesen, em 1696, por ser «homem de raro engenho, e mui fasil no pintar», o que se confirma face à boa qualidade de desenho deste Beijo de Judas, inspirado nos modelos de Roma do tempo de Gregório XIII e Sisto V, em que o pintor se formou. O tema, que Simão repetiu numa das tábuas da sacristia da Sé Velha de Coimbra (c. 1607), hoje no Museu Nacional Machado de Castro, bem como em duas tábuas de oficina, uma no retábulo da Misericórdia de Tancos (c. 1600), exposto no Museu Diocesano de Santarém, e outra na igreja de Santa Maria do Castelo de Torres Vedras, é tratado com elegância compositiva e sentido didascálico, atento a pormenores de chiaroscuro que a atmosfera de notturno acentua. Simão viu, por certo, os frescos do Oratorio del Gonfalone em Roma, onde pode ter tomado modelo inspirador para esta precisa composição. A sua arte, de facto, segue os mesmos modelos da pittura senza tempo de vínculo tridentino, sobretudo os da pintura romana da geração de Federico Zuccaro, Cesare Nebbia ou Livio Agresti, sem esquecer Pomarâncio, e a lição do português Campelo, em que se inspirou em mais que uma obra. É essa mesma linguagem tardo-maneirista, que dominava os cânones imagéticos da Contra-Reforma nos anos jubilares circa 1600, que se sente nesta pintura, tão atenta à clareza do discurso devocional.
Como foi pela primeira vez destacado por Adriano de Gusmão, no livro Simão Rodrigues e seus colaboradores (1956), as obras mais individualizadas do pintor atestam uma qualidade que se superioriza aos dos seus contemporâneos, como se vê nas obras de Coimbra (sacristia da igreja do Carmo e capela da Universidade). Dirigiu uma operosíssima oficina na freguesia do Socorro, em Lisboa, onde actuaram vários participantes, como o futuro pintor régio Domingos Vieira Serrão (c. 1565-1632), e vários outros de que se conhecem os nomes e as obras, o que conduziu a que muitas das encomendas geradas nesse âmbito padeçam de repetitividades de receita e revelem fragilidades de acabamento. Não é o caso desta esplêndida pintura do Beijo de Judas, saída directamente das mãos do mestre. Trata-se de peça muito típica do seu repertório directo, com a robustez de pose das figuras (a postura dos soldados, por exemplo, repete-se em tábuas como as do antigo retábulo de Santa Cruz de Coimbra, hoje na sacristia do Carmo dessa cidade, de 1611), bem como o forte sentido de pathos que a modelação de claro-escuro acentua. Atesta-se, enfim, a soltura de desenho no modo muito pessoal de caracterizar os escorços de cabeças, que valem como assinaturas do artista.

Vítor Serrão,
Historiador de Arte.

A Cabral Moncada Leilões regista e agradece ao Professor Doutor Vítor Serrão o enquadramento histórico e artístico da obra em causa.

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