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GIOVACCHINO BELLI - ACT. 1788-1822 Cruz-relicário do Santo Lenho com Pietà cruz em bronze dourado e patinado a negro aplicações em metal, resplendor e frisos relevados em prata de 889/1000 figurando cenas da Paixão de Cristo Roma (1815-1822) falta da parte inferior da lança, falta da relíquia e do vidro que cobriria o receptáculo da mesma, pequenas faltas no dourado, outros pequenos defeitos marca da Reverenda Câmara Apostólica Nº 168 (tiara pontifícia e chaves cruzadas) para os objectos de dimensão média e com bondade da prata de 10 onças e 16 dinheiros (889/1000), em uso entre 1815 e 1870 (BULGARI 1958, BULGARI CALISSONI 1987), marca de ourives Nº 242 (as iniciais G e B dentro de um losango) de Giovacchino Belli (act. 1788-1822), sem marcas portuguesas ao abrigo do Decreto-Lei n.º 120/2017, de 15 de Setembro, art. 2, nº 2, alínea c) Dimensões (altura x comprimento x largura) - (total) 69,5 cm Notas: Trata-se de uma monumental estauroteca, uma cruz-relicário do Santo Lenho, perfeitamente enquadrada no gosto neoclássico que dominava o panorama romano nos primeiros anos de Oitocentos.Composta por plinto, de secção rectangular, base, de secção oval, sobre a qual assenta a figuração de vulto da Pietà, a peça concede naturalmente protagonismo à cruz (numa óbvia alusão à proveniência da relíquia), que se assume também como centro do programa iconográfico, relativo, como seria expectável, à Paixão de Cristo. Este desenvolve-se em narrativa contínua, na banda que percorre o elemento de secção oval, nos três medalhões do plinto (de evidente feição clássica) e ainda nos três tondi observáveis nos topos dos braços da cruz.A temática da Paixão é ainda enfatizada pela presença da lança e da vara com a esponja embebida em vinagre, dispostas em aspa.Na interceção dos dois braços da cruz, identifica-se o receptáculo que originalmente conteve a relíquia do Santo Lenho.Na base da cruz, onde por norma surge a caveira, numa remissão para o Monte Gólgota, onde se consumou a Crucificação de Cristo, a presença tridimensional da Pietà, segundo o modelo escultórico de Miguel Ângelo, convidava o fiel, aquando da veneração da relíquia, a reflectir preferencialmente na Piedade, personificada na figura da Virgem com seu filho morto nos braços.Giovacchino Belli era, desde a última década do século XVIII, o representante de uma família detentora de uma importante oficina de ourives activa em Roma desde que seu pai, Vicenzo Belli (1710-1777), oriundo da sua Turim natal, se fixara na cidade pontifícia (c. 1741). Em Roma, Vincenzo Belli foi o patriarca de uma família que contou sucessivas gerações de ourives, cuja oficina se manteve em plena laboração durante os séculos XVIII e XIX. O filho, Giovacchino (ou Gioacchino, 1756-1822), autor desta estauroteca, que se submeteu às necessárias provas com vista à confirmação da patente paterna, sucedeu na direcção da oficina, que, à data da morte de Vincenzo, contava com cerca de vinte trabalhadores. A Giovacchino sucedeu seu filho Pietro (1780-1828), e depois os netos Vincenzo (activ. 1828-1859) e Antonio (activ. 1860-1867), assegurando uma actividade contínua da antiga oficina familiar até, pelo menos, 1867 (BULGARI 1958, BULGARI CALISSONI 1987, VALE 2019).Entre a clientela dos Belli contam-se algumas das mais importantes famílias da aristocracia romana da centúria de Setecentos e Oitocentos – dos Colonna aos Barberini, passando pelos Odescalchi – e naturalmente também numerosos eclesiásticos, membros da Cúria Pontifícia. Entre a ilustre clientela dos Belli, convém assinalar o rei de Portugal D. João V (1689-1750), para quem Vincenzo realizou um magnífico conjunto de gomil e lavanda, no contexto da colecção de ourivesaria da capela de S. João Baptista (Museu de São Roque, Lisboa, inv. MPr27 e MPr28) (VALE 2016).O presente relicário do Santo Lenho, integrando a figuração da Pietà, assume-se como uma obra de particular interesse, perfeitamente enquadrada no gosto neoclássico do tempo, mas dando continuidade à relevância da componente escultórica, que caracteriza a ourivesaria romana de Setecentos. A tal não é certamente alheia a circunstância de se ter formado o seu autor num ambiente em que tal importância da escultura, no âmbito da obra de ourivesaria, era por demais reconhecida. Do ponto de vista compositivo, a peça constrói-se tendo a cruz por centro, como ocorre nesta tipologia de objecto, que particularmente se difunde na Europa no seguimento das cruzadas e da consequente chegada de várias relíquias do Santo Lenho. Datam dos primeiros anos de Oitocentos alguns exemplares particularmente requintados, realizados em ambiente romano, que com clareza influenciaram esta estauroteca, nomeadamente a cruz-relicário (datada de 1803), proveniente de uma outra importante oficina familiar, então sob a direcção de Giuseppe Valadier (1762-1839), e que se conserva na Basílica de Santa Croce in Gerusalemme de Roma.Teresa Leonor ValeLisboa, 21-11-2024BIBLIOGRAFIABULGARI 1958BULGARI, Costantino - Argentieri, Gemmari e Orafi d’Italia. Vol. I, Roma: Lorenzo del Turco, 1958BULGARI CALISSONI 1987BULGARI CALISSONI, Anna - Argentieri, Gemmari e Orafi di Roma. Roma: Fratelli Palombi Editori, 1987VALE 2016VALE, Teresa Leonor M. - Ourivesaria Barroca Italiana em Portugal: presença e influência. Lisboa: Scribe, 2016, pp. 157-158, 611VALE 2019VALE, Teresa Leonor M. - “Vincenzo Belli (1710-1787): percurso de um ourives: um turinês em Roma que trabalhou para Lisboa”, in MOTA, Isabel Ferreira da, SPANTIGATI, Carla Enrica (coord.) - “Tanto Ella Assume Novitate al Fianco”. Lisboa, Turim e o intercâmbio cultural do século das luzes à Europa pós-napoleónica. Coimbra: Imprensa da Universidade de Coimbra, 2019, pp. 189-221.A Cabral Moncada Leilões agradece à Doutora Teresa Leonor Vale o estudo da obra e a elaboração do presente texto.