Leilão 171 - page 160

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21 de Setembro de 2015
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Documento do século XVI (1578).- 1 f. (1 bifólio); ±305x215 mm.
€ 5.000 - 7.500
Carta missiva de D. Henrique (rei de Portugal, 1578-1580) dirigida
a D. Rodrigo de Meneses, do Conselho Régio, informando-o da
chegada de uma carta dos representantes dos fidalgos cativos em
Fez. Pede-lhe que dê conta do resultado das diligências de que foi
incumbido pelo rei quanto ao resgate destes fidalgos e que lhes
transmita a boa recepção da sua carta. Escrita cursiva híbrida, de
base humanista, com elementos da gótica cursiva. Terço superior
do bifólio com forte mancha, permitindo, contudo a leitura
integral (papel de baixa gramagem e espessura fina). Assinatura
autógrafa: Rey. Conserva o selo de chapa com as armas de
Portugal. Documento datado de Lisboa, 7 de Novembro de 1578.
Dom Rodrigo de meneses Amigo, Eu El Rej vos enujo muito
Saudar. Per Via de Tengere Reçebj hua Carta dos fidalgos
que Estão Catiuos em fez, feita a xviij de Setembro, (asinada
por aqueles que forão Ellectos pera em nome E por parte
de todos tratarem seus negoçios) em que me dão conta
do estado em que até então Estauão, que não Era inda
de conclusão, (nem conuinha tomar-se sem ordem minha.)
E Juntamente me derão outra Carta de dom Duarte de meneses,
E outra de dom fernando de Castro, sobre a mesma materja,
Cuja sustançia de todas tres, Era pedirem-me Me lembrasse
daqueles fidalgos catiuos, ao que não tenho que Responder
emquoanto me não chega Recado E auiso Vosso do
que conforme a Vossa instrução tendes feito nesta materja,
que tam particularmente Vos tenho encomendado, Pelo quoal
Recado Ja agora cada dia Espero. Encomendo-uos muito
que pela primeira pessoa de Recado e segura que for pera fez,
ou por via dos padres da trindade, (que será inda milhor)
auiseis estes fidalgos <Electos> de como Reçebj suas Cartas,
E que não Respondo a Ellas, assy por Esperar Ja agora cada dia
pelo Vosso auiso (como açima digo) E por outras cartas Suas
mays Largas E declaradas; como tambem pelo inconueniente
que seria ver-se em fez Carta // Minha. E que lhes encomendo
mujto que proçedão neste negoçio de seus Resgates conforme
ao que eu deles confio E espero, pera que não aJa cousa que
impida effectuarem-se como conuem a Elles E a tudo, de que
tenho aquela mesma Lembrança que Elles podem deseJar,. E se
o padre frej Roque for o que ouuer de falar com Eles, dar-lh'eis
esta Carta, pera lha mostrar, se a Vos E a Elle <vos> pareçer que
se pode fazer, sem nisso auer risco, porque desejo muito
de animar E consolar estes fidalgos, E todos os outros que Estão
Catiuos, Scripta em Lixboa a vij de nouembro de MDLxxviij.
(ass.) Rey
Transcrição de Susana Tavares Pedro
Notas: a 4 de Agosto de 1578 travou-se, contra um grande exército
marroquino liderado pelo Sultão de Marrocos Mulay Mohammed (Abu
Abdallah Mohammed Saadi II, da dinastia Saadi) com apoio otomano,
a batalha de Alcácer-Quibir (Al Quasr al-kibr). Foi um dos
acontecimentos mais marcantes da História de Portugal, quer pelo
conjunto de circunstâncias que culminou na expedição a Marrocos,
quer pelas consequências políticas que acarretou para o Reino. Nela
desapareceram um jovem rei de 24 anos de idade, solteiro, sem
descendência nem herdeiro designado em caso de fatalidade, como veio
a acontecer, bem como, para além dos milhares de soldados anónimos,
um elevado número de membros da fidalguia e da mais alta nobreza
portuguesas que integrou a expedição militar ao Norte de África.
Muito se escreveu, com as mais diversas interpretações e apreciações,
sobre os projectos africanos de D. Sebastião. Não nos cabe avaliar
ou “tomar partido” na inesgotável questão acerca dos desígnios do rei
e sobre a sua figura, antes e depois de morto; mas não podemos
pretender que D. Sebastião estivesse só na visão e no impulso que
o conduziriam ao derradeiro momento de Alcácer-Quibir, em Agosto
de 1578. Na verdade, como foi notado em recente biografia do
monarca, o problema deve ser analisado deixando de o acantonar
na sempre invocada obsessão ou “monomania” (Felix Llanos y Torriglia,
Contribución al Estudio de la Reina de Portugal, Hermana de Carlos V,
Doña Catalina de Austria, 1923, p. 68) de D. Sebastião pela cruzada
e pela conquista em Marrocos - que não deixou em todo o caso,
sobretudo a partir de dada altura, de existir - para ser visto, nos seus
fundamentos, também como um projecto “partilhado e defendido por
outras figuras políticas do país [que] visava, de facto, a salvaguarda
de uma zona atlântica, frente ao estreito de Gibraltar, crucial não só
para a defesa das praças portuguesas no Norte de África, das
populações do litoral português, em especial as do Algarve e das ilhas
atlânticas, mas também para a segurança dos diferentes interesses
marítimos e continentais do império português” (Maria Augusta Lima
Cruz, D. Sebastião, 2006, pp. 211-212).
O projecto do monarca português amadureceu e foi tomando forma
num quadro de crescente tensão entre grupos e cliques, apoiando
uns a pretensão do rei, outros mostrando reservas ou a ela se opondo
frontalmente. De entre estes destacamos D. Catarina de Áustria, sua
avó, e o Cardeal D. Henrique, seu tio. Ambos, de formas, e com recurso a
estratégias e argumentos diferentes, procuraram dissuadir D. Sebastião
da jornada, num processo em que, pela mão de D. Catarina, Filipe II
entrou, de modo directo, mas sempre ambíguo, na cena política
portuguesa, de que o famoso encontro no Mosteiro de Guadalupe entre
ambos os monarcas ibéricos, no final do ano de 1576, foi a expressão
maior. Mas a jornada fez-se, redundando no desastre militar, político
e colectivo que conhecemos: o desbaratamento do exército português,
o desaparecimento do rei, a mortandade (entre 8 000 e 9 000 mortos),
o caos e o tumulto, os quase 10 000 portugueses que permaneceram
cativos em solo africano. No quadro de uma intensa comoção
e ansiedade colectivas perante a catástrofe, a entronização de um novo
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