Leilão 174 - page 80

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cabral moncada leilões 174
14 de Dezembro de 2015
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r
essurreição
,
óleo sobre madeira, escola portuguesa, séc. XVI (C. 1530),
restauros, vestígios de insectos xilófagos
Dim. - 112 x 119 cm
€ 50.000 - 75.000
t
he
r
esurrection
,
oil on board, Portuguese school, 16th C., (circa 1530),
restorations, traces of wood insects
Nota: “a tábua da Ressurreição de Cristo, executada sobre madeira
de carvalho, com as dimensões de 112 x 119 cm, data do segundo
quartel do século XVI, quase de certeza de cerca de 1530, e procede
de algum dos extintos conventos de Évora, onde constituiria o retábulo
de um altar de capela. A produção deve-se a um bom mestre da
chamada Oficina do Espinheiro, que desenha e compõe com eficiência
e se mostra um seguidor fiel dos modelos luso-neerlandeses do círculo
de Frei Carlos. Trata-se, por isso, de uma peça de grande importância,
conquanto anónima, pois se perfila, em termos estilísticos
e compositivos, na sequência de uma outra pintura da Ressurreição
de Cristo, da autoria de Frei Carlos (MNAA), o famoso monge-pintor
que dirigiu a oficina sediada naquele mosteiro ieronimita eborense. Esta
valiosa pintura renascentista tem especificidades autorais que merecem
ser destacadas. Ainda que não mostre, como é natural, a mesma finura
e transparência de pincéis das obras de Frei Carlos, ela revela, mesmo
assim, uma ciência de pincéis apurada, numa espécie de
desenvolvimento maduro dos repertórios daquele mestre. O desenho
é de um modo geral seguro, o sentimento da cor é vibrante, com
destaque para os vermelhos e os amarelos, a paisagem desenvolve
o mesmo tipo brugense das pinturas de Frei Carlos, os relevos roqueiros,
a vegetação, as figurinhas de segundos planos e a cidade no fundo
revelam a plenitude do gosto neerlandês então adoptado nas oficinas
portuguesas da época de D. Manuel e de D. João III, e tudo mostra uma
execução plástica muito qualificada. A peça trai, também, a influência
estilística dos grandes retábulos do mosteiro de São Francisco de Évora, da
autoria de um outro flamengo activo em Évora, Francisco Henriques
(c. 1508-11), tal como bem fez notar o historiador de arte José Alberto
Seabra, referindo especialmente os fundos do Noli me Tangere. Por este
aspecto, ela constitui como que uma síntese – elaborada por um artista
ainda desconhecido da Oficina do Espinheiro – do estilo dos dois grandes
mestres nórdicos activos na capital alentejana (Francisco Henriques
e Frei Carlos). O valor artístico desta peça é muito amplo: além de vir
documentar a actividade ainda obscura de um artista formado nesse círculo
luso-flamengo, tão importante na encomenda religiosa da época manuelina
joanina, mostra linhas de evolução e enriquecimento da própria Oficina
do Espinheiro nos seus repertórios tradicionais, tanto no tipo das
indumentárias, na riqueza da armaria, nas poses agitadas e no ritmo
de movimentação das figuras, oposto à quietude e atmosfera de silêncio
geralmente dominantes na obra de Frei Carlos. De certo modo, e ao mesmo
tempo que subsistem fidelidades a repertórios de oficina, aparecem
já sintomas de novos caminhos e influências que superam o gosto
luso-brugense do mundo de Frei Carlos e se abrem a seduções de outros
referenciais renascentistas, como os modelos de Antuérpia, que na quarta
década do século XVI (data provável desta tábua) se insinuavam fortemente
na nova geração de pintores nacionais. A pintura, localizada nos anos 40
do século passado numa Quinta dos arredores de Évora pelo historiador
de arte Túlio Espanca, e que mereceu em 1943 uma referência explícita
do Dr. João Couto, director do MNAA, era até há pouco de paradeiro
desconhecido, pois dela só existia uma longínqua memória pelo breve
registo daqueles autores. Foi beneficiada e exposta do recente certame
Primitivos Portugueses 1450 1550. O Século de Nuno Gonçalves,
no Museu Nacional de Arte Antiga, com o nº 50 e reproduzida a p. 172.”
Vitor Serrão, Historiador de Arte (IHA-FLUL)
Bibliografia:
- ESPANCA, Túlio - “Património Artístico de Évora - Freguesias Rurais”.
Évora: 1957, pp. 59-60.
- ESPANCA, Túlio - “Inventário Artístico de Portugal, Concelho de Évora”.
Lisboa: ANBA Academia Nacional de Belas-Artes de Lisboa, 1966, p. 340.
- COUTO, João “A Pintura Flamenga em Évora no século XVI, Variedade de
estilos e de Técnicas na Obra atribuída a Frei Carlos”. Évora: 1943.
- COUTO, João - “A Oficina de Frei Carlos”. Lisboa: Realizações Artis, 1955.
- HENRIQUES, Ana de Castro (coord.) - “Primitivos Portugueses, 1450-1550.
O século de Nuno Gonçalves”, catálogo da exposição. Lisboa: IMC/MNAA -
Athena/Babel, 2010, p. 172 F., nº 50.
- HENRIQUES, Ana de Castro (coord.) - “O Frei Carlos da América -
Investigação e Crítica”. Lisboa: DGPC/MNAA, 2013, p. 38.
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